Mostrando postagens com marcador Gigante. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Gigante. Mostrar todas as postagens

domingo, 10 de outubro de 2010

Gigante, de Adrián Biniez

Para comemorar meu décimo texto no blog - já falei aqui antes que sou coruja - resolvi escrever algumas impressões sobre o filme uruguaio Gigante, primeiro longa do diretor argentino Adrián Biniez.

O filme é de 2009, mas assisti semana passada na Mostra Cinusp - Para Gostar de Cinema 2006 a 2009 (vale dizer, ainda em cartaz) e achei o filme excelente. Premiado pela crítica no Festival de Berlim e em Gramado com prêmios de melhor roteiro, melhor diretor e melhor ator, além de levar o troféu especial para inovação cinematográfica, é possível encontrar inúmeros comentários e artigos elogiosos ao filme e ao personagem de Horacio Camandule, o segurança Jara.

Mais homogêneos que as indicações sobre o gênero do filme, que vão da comédia à comédia romântica e ao drama - os comentários sobre o personagem Jara giram em torno de seu romantismo, contrapondo o fato de ele ser um “sujeito grandalhão” ao de ter “um coração sensível e apaixonado”.

Encontrei até um artigo que dizia, a propósito dessa contraposição, que os brutos também amam, embora à maneira deles.

Mas que maneira seria essa? Mais que um romântico, Jara é um sujeito íntegro, de bom caráter, sensível e bacana. E mesmo com essas características de um típico “gente boa” não deixa de ser bastante agressivo em algumas situações que exigiram - ou nas quais ele quis demonstrar - sua força e/ ou sua raiva.

Talvez Biniez nem tenha pensado nessa questão ao criar o roteiro, mas acho que foi o filme mais não machista que eu já assisti. Ainda estou tentando lembrar de outro e não consigo. Para mim essa é a grande sacada do diretor em relação à criação do personagem, com fortes características convencionalmente associadas ao feminino, tais como a sensibilidade, a doçura e o romantismo, e absolutamente convincente em sua masculinidade.

A associação desses traços em homens à afeminação não é incomum e, muitas vezes, para reforçar o rótulo de afeminado são acrescentadas palavras de mau gosto bastante machistas tais como maricas, mariquinha, mulherzinha e coisas do tipo. No caso de Gigante, acho praticamente impossível que alguém associe Jara a algum desses xingamentos, não apenas porque ele é agressivo, aliás, é um equívoco bastante comum achar que homens com traços ditos afeminados não são agressivos.

Considero que essa é outra sacada incrível do não machismo de Gigante: não me parece que a constituição do masculino de Jara esteja essencialmente marcada pela agressividade ou pela força, há momentos em que isso aparece mas não considero o ponto central que faz sua masculinidade inquestionável. Para mim isso é demonstrado na coerência dessa constituição masculina, por sinal genial do diretor, em que através de inúmeras e sutis situações ele vai nos apresentando a personagem em suas contradições.

Assim, ao mesmo tempo em que Jara está interessado em saber o desfecho do encontro de Júlia, perde o casal de vista num momento tenso do jogo do futebol, que prende sua atenção. Ao mesmo tempo em que expulsa 2 sujeitos briguentos da danceteria onde trabalha demonstra preocupação com o cara que estava sendo achincalhado pelo outro. Ao mesmo tempo em que obriga o sobrinho a seguir Júlia junto com ele depois brinca com o garoto de luta de espadas.

Essas são algumas das situações que, no meu entendimento, contribuíram para a genial constituição não machista do filme e de Jara, um sujeito que teria tudo para ser um tipo de machão, não apenas por seu tamanho e força, mas por estar vinculado a um universo de pouca polidez e delicadeza. Ao contrário disso, o diretor Adrián Biniez conseguiu transformar um cara simples, com pouco estudo e poucos recursos num Gigante.
 
Há muitos outros elementos que fazem com que o Gigante seja imperdível para quem gosta de filmes excelentes, desses que nos deixam arrebatados com tamanho encanto e emoção, mas reservo-me aqui o direito de deixar que vocês os descubram por si próprios.
 

Gigante, direção Adrián Biniez, Uruguai-Argentina-Alemanha-Espanha, 2009, 90’.




Sites consultados:

http://cinema.uol.com.br/
http://www.estadao.com.br/
http://www.tripcult.com.br/