terça-feira, 20 de julho de 2010

Improvável

Imagem: www.improvavel.com.br
Há umas duas semanas um grande amigo me convidou para assistir um espetáculo que está em cartaz no Tuca. “Os Improváveis”, ele disse, comentando que era uma peça concorrida porque estava fazendo muito sucesso: ele havia comprado ingressos com quatro meses de antecedência. Depois, um dos atores comentou que o nome da peça é “Improvável”; parece que é comum a confusão, talvez porque o público associe o título aos vários atores e não à improvável proposta.


O fato é que eu não sabia nada sobre a montagem, então fui inocente ao que pensei apenas ser o que chamo de “programa cultural pop”.

Chegando lá, aquela primeira situação que paulistano está acostumado e normalmente reclama muito: o cara que, teoricamente, vai olhar seu carro e quer 10,00 antecipados pela vaga. O problema começa aí, freqüentar lugares assim sem ter o poder aquisitivo de quem freqüenta. Nem eu nem meu amigo tínhamos 10,00 para pagar o cara, o dinheiro estava contado, essas coisas de gente dura que insiste em não abrir mão de programas culturais.

Claro que a primeira sensação que vem é aquela de exploração, afinal, a rua é pública, 10 reais é muito caro e, provavelmente, quando você sair do teatro o cara não vai estar mais lá, como aconteceu de fato. Mas esse é o tipo de coisa que acho que precisa ser examinada num contexto mais amplo, afinal, mesmo sem grana e estacionando num carrinho popular, quando comparamos nossa situação com a daquele sujeito que estava ali àquela hora tentando ganhar a vida e não em casa descansando ou tendo a oportunidade de entrar no Tuca fica interessante questionar quem é o verdadeiro explorado nessa história.

Já no teatro, tive a sensação de estar nos bastidores de alguma novela, como se estivesse num “outro” Brasil, que você não vai ter contato andando pelas ruas. Mesmo andando por lugares como a Avenida Paulista, que continua sendo uma rua nobre de São Paulo, cores, estilos e formas se misturam, mas é como eu já disse antes, era um programa “pop”, nada mais razoável do que encontrar ali “pessoas pop” também.

Quando o apresentador entrou em cena parte da platéia foi ao delírio – a peça é como se fosse um programa de TV, com vários quadros diferentes e em cada um desses quadros acontece uma ou várias cenas improvisadas a partir de sugestões feitas pelo público. Pensei estar num programa de televisão no momento em que um ator famoso entra no palco. Gritos e aplausos precediam e eram reforçados após as piadinhas naquela primeira parte, que meu amigo explicou como sendo um tal de “stand up comedy”.

Depois entraram os outros atores e aí eu tive dúvidas se realmente não estaria na TV, porque aos gritos e aplausos acrescentaram-se palavras gritadas tais como “lindo” e “gostoso”.

Chocada com tantas demonstrações, a meu ver, exageradas, meu amigo me explicou que este espetáculo estava há bastante tempo em cartaz, que era um grande sucesso na internet, o que deve justificar que quase um terço da platéia daquele dia estava ali, não pela primeira vez, prestigiando empolgadamente o “Improvável”.

É possível que seja essa empolgação que faça o espetáculo parecer melhor do que realmente é, porque, a meu ver, embora algumas cenas tenham sido boas, a maior parte deixou muito a desejar. Isso porque talvez seja mais fácil, por exemplo, improvisar uma cena e inserir nela uma determinada frase do que elaborar uma cena que tenha como mote a mesma frase. O que ocorreu foi um pouco isso, à medida em que a proposta para cada quadro/ conjunto de cenas ficou mais complexa as cenas foram ficando mais pobres e menos engraçadas, algumas até de mau gosto, como em uma proposta que tinha como mote uma frase do tipo “o que não fazer em um teatro de fantoches” e os atores fizeram duas cenas com alusões à manipulação do animador de fantoches, que estaria com os dedos no ânus dos bonecos.

Se a motivação principal da peça é improvisação e humor, considero um espetáculo mediano, que não tem nada de excepcional, opinião que, seguramente, não é compartilhada pelo público fã do “Improvável” que, ao final, expressou sua aprovação de forma contundente, novamente com aplausos, gritos e assovios. Contudo, a meu ver, essas manifestações não demonstram a excelência do espetáculo, apenas explicam que o sucesso é muito mais devido ao público do que ao espetáculo em si.

4 comentários:

Anônimo disse...

Bom comentário!
A sua crítica foi muito bem fundamentada,principalmente relacionado as pessoas que assistem a peça,normalmente tem pouca falta de crítica e elevam o ego dos atores.
Gosto muito da peça,é algo realmente criativo e original,mostra o talento de alguns atores.Na peça participa diversos atores nuncam são os mesmos,é um rodízio...comparo muito como a formação de um time de futebol,às vezes dá certo,às vezes não.

A sensação de estar dentro de um programa de TV é que é gravado e colocado no Youtube(jogada de marketing).Outra coisa importante é a inspiração dos atores.E neste dia da maneira que você está descrevendo não foram nada bem,vai depender muito também do jogo de cintura e competencia destes bons atores/atriz...enfim...assistir está peça no teatro é uma bosta,pela platéia,pelo excessivo sucesso e como é Improvável,bem...tudo pode acontecer.
Um bju!
Boa noite
Danilo
P.S-Houve algum ator que interpretou bem?

Jany Canela disse...

Oi Dan, obrigada pelas suas considerações tão gentis :)
Então, quando vi o site da peça observei essas mudanças q você falou, no dia q a gente foi tinha um ator convidado, parece q isso é algo que há com freqüência. Acho q o problema não é os atores não serem bons intérpretes, como eu disse houve algumas cenas boas. Talvez naquele dia o espetáculo não tenha sido tão bom quanto em outros dias, mas mesmo assim houve um público cativo que vibrou e descabelou como se o espetáculo tivesse sido excelente, aí é possível desconfiar um pouco de q talvez o espetáculo não seja tudo isso, mas mesmo q a apresentação não seja tão boa, os fãs já vão acreditando q será ótima por toda a imagem construída anteriormente e aí, para eles, fica ótimo mesmo.

Rafa Araújo disse...

Jany,

Seu ponto de vista é realmente surpreendete e me levou aos risos! Me deliciei com tamanho bom-humor e com análises singulares sobre sua experiência em participar de um - em suas próprias palavras - "programa cultural pop".
Senti-me lisonjeado em ter sido citado no texto como o tal "grande amigo" que a acompanhou na apresentação do "Improvável". Interessante comparar o momento em que eu estava ali do seu lado, com a atual releitura de todos os acontecimentos e aspectos daquele dia, através de seu olhar e suas críticas bem diferenciadas daquele público "pop". Não que eu não faça parte deste público, em termos...
Também concordo que a peça foi feita sob medida para agradar seu público-alvo e ouso descrevê-lo (e me incluo nele): em sua maioria formado por pessoas que assistem às novelas da Globo, e/ou que leem semanalmente a revista Veja, e/ou que frequentam bares e baladas do Jardins e da Vila Madalena, e/ou que pagaram os 10 reais ao flanelinha para estacionar seus lindos carros, e/ou que navegam com assiduidade pela internet em busca de vídeos de humor, como melhores momentos dos programas Pânico na TV e CQC ou quadros de stand up comedy, como dos próprios "Improváveis". Não seria hipócrita em dizer que nunca fiz nenhuma das tarefas anteriores, mas com certeza deduzo que o público desta peça muito provavelmente as faz com maior frequência. E acredito que este fator ajudou e muito para a boa receptividade das piadas bem "burguesas". É por isso que, quando faço um programa como assistir a uma peça de grande bilheteria ou a um filme "blockbuster", costumo dizer que é preciso "deixar o cérebro na bilheteria" para tentar curtir melhor o evento. Quando digo tal expressão, o faço para representar o ato de apenas entreter, divertir ou rir, sem levar em consideração uma análise mais crítica e cultural sobre a proposta.
Agora com o cérebro no lugar, posso até refletir e concordar que a fama do espetáculo realmente o precede, e que seu público aparenta já ter sido "comprado" pela forte mídia dos vários (bons) vídeos que são divulgados na internet e dos progamas que apresentam na TV. Talvez os atores já devam ter realizado apresentações mais criativas e engraçadas. Talvez o sucesso já declarado da peça seja um desestímulo para a total entrega e dedicação dos atores em cena a cada semana, já que os mesmos se deparam sempre com a casa cheia e a platéia aplaudindo em pé antes mesmo de entrarem em cena.
Porém, devo admitir que achei o espetáculo válido como aprendizado para, além de perceber todas as falhas comentadas - muitos piadas de mau gosto, cenas pouco engraçadas etc -, apreciar algumas boas técnicas de improvisação em cena. E tais técnicas, acredito eu, não deveriam ser fáceis de ser colocadas em prática para um público exigente, se fosse esta a situação. Como este não é o caso do público que frequenta o Tuca às sextas-feiras, isso não foi um grande problema para os famosos e queridos atores desta peça.
Ainda fiquei com apetite de ver uma boa peça teatral baseada na Arte do Improviso. Quem sabe um dia iremos ver juntos a "Jogando no Quintal", tão comentada por nossos colegas do teatro? Fica a dica e aguardo novos programas, sejam eles mais "cults" ou mais "pops", mas sempre improváveis.

;D

Magna Eliez disse...

Não assisti ao "Os Improvaveis" mas assisti a "jogando no quintal" com certeza vc,Rafa e a Jany vão gostar...pois é bem diferente deste tipo de espetaculo que nos impoem por aí.....

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